Antônio Gargioni
23 de junho de 2023
A Uber mudou o mundo em diferentes frentes. Conheça a estratégia da Uber para dominar o mercado dos transportes e transformar como entendemos a mobilidade urbana.
A história da Uber é diferente de muitas startups. É uma história de sucesso, sem dúvidas, mas é também problemática e fascinante.
Os números da Uber são astronômicos e a empresa é um grande exemplo de como ser disruptiva e inovadora como marca. Porém, conforme analisamos a história da empresa, notamos que ela encarou e ainda encara muitos desafios.
Vamos conhecer alguns deles, além de entender como a Uber virou referência de transporte urbano ao redor do mundo. Mas para isso, precisamos fazer uma viagem para Paris, em 2008 para entender como tudo começou.
Era uma noite de neve em Paris, no ano de 2008. Dois amigos e empresários de sucesso, Travis Kalanick e Garrett Camp, estavam na conferência anual de tecnologia conhecida como LeWeb. Porém, mais do que isso, eles estavam tentando conseguir um táxi, mas não achavam nenhum.
“Mas e se conseguíssemos chamar um carro com o celular?”
Essa ideia, totalmente fundamentada em uma necessidade real, foi a faísca para a criação da Uber. Apesar de terem se separado após a conferência,Camp continuou fixado pela ideia que havia tido em Paris. E quando voltou para São Francisco, comprou o domínio UberCab.com.
Em 2009, Camp ainda era CEO de outra startup e estava trabalhando no seu projeto da UberCab como algo paralelo. Nessa época, a UberCab era um serviço de aluguel compartilhado de carros de luxo por um app.
Garrett conseguiu persuadir Kalanick a se unir a UberCab numa posição de conselheiro em 2010. O primeiro passageiro da Uber solicitou uma corrida ao redor de São Francisco no dia 5 de julho de 2010.
Kalanick se tornou CEO da empresa em dezembro de 2010 e o atual CEO, Ryan Graves, tornou-se o primeiro COO da Uber e membro do conselho da companhia. Era o início de algo que iria transformar a mobilidade urbana dos EUA e consequentemente, do mundo.
O app da Uber permitiu que seus usuários pudessem solicitar uma corrida ao apertar um botão. O GPS identificava a localização do motorista e o preço da corrida era automaticamente cobrado no cartão do passageiro.
A simplicidade do aplicativo foi o combustível da sua popularidade inicial entre usuários e investidores. Dessa forma, a startup rapidamente se tornou uma das principais empresas de São Francisco.
Em outubro de 2010, a Uber conseguiu seu primeiro grande investimento, no valor de $1.25 milhões de dólares. Isso fez com que seu crescimento fosse meteórico. Naquele mesmo ano, a empresa levantou $11 milhões de dólares e expandiu suas operações para Nova York, Seattle, Chicago, Boston e Washington, além de Paris.
Ou seja, apenas um ano depois da sua primeira corrida, a Uber já havia expandido suas operações de forma internacional. E não havia lugar melhor do que Paris, onde a ideia que se tornaria a empresa, nasceu.
Em dezembro de 2011, na conferência LaWeb, responsável pela criação da Uber, Kalanick anunciou que a empresa havia levantado mais $32 milhões de dólares. Além disso, ele também anunciou que investidores como Jeff Bezos e Goldman Sachs haviam começado a investir na companhia.
Um ano depois, a Uber lançou seu produto mais popular, o UberX. Esse serviço fornece carros mais acessíveis como alternativa ao Uber Black, produto original da empresa. Esse lançamento transformou a Uber em uma empresa de massa.
Tudo isso ensina uma grande lição: construa soluções para problemas reais. Serviços e produtos de sucesso são aqueles que identificam um problema real e utilizam a tecnologia para resolvê-lo. Os criadores da Uber transformaram a necessidade de pegar um táxi numa noite fria em uma das empresas mais revolucionárias do século.
Quando falamos sobre os modelos de negócio da Uber, é preciso citar que a empresa diversificou os seus serviços desde seu lançamento. Hoje, a companhia é muito mais do que uma empresa que aluga carros para trajetos específicos. Ela está no ramo alimentício com o UberEats e das entregas com o Uber Freight.
Dito isso, a ideia base por trás do modelo de negócio da Uber é simples: conectar passageiros que precisam chegar a um certo lugar com motoristas dispostos a os levarem até lá. Ou seja, os passageiros criam uma demanda e os motoristas suprem, com o Uber agindo como o marketplace que conecta ambas as partes.
Como foi possível observar, a Uber tem dois clientes-base: os motoristas e os passageiros. Sendo assim, a empresa precisa ter valores bem definidos para atrair mais usuários para a sua plataforma. Isso garante o funcionamento ideal do aplicativo.
Vamos entender quais são as principais propostas de valor da Uber:
Para os passageiros:
Para os motoristas:
A Uber fez um trabalho incrível na captação dos seus primeiros usuários. Tanto seus passageiros quanto pilotos. Quando se fala do lançamento de um marketplace, as primeiras semanas são essenciais, uma vez que é preciso haver demanda e oferta suficientes para que o serviço siga em frente.
A Uber desenvolveu um sistema de geolocalização focado no Vale do Silício. Eles sabiam que lançando o app ali, poderiam interagir com as pessoas que trabalhavam com tecnologia e inovação na região e o serviço poderia melhorar a vida dessas pessoas.
Para saber mais sobre marketing de geolocalização, leia o nosso texto sobre o assunto.
Essas pessoas eram os primeiros usuários perfeitos e a empresa fez um ótimo serviço de captação, patrocinando eventos de tecnologia, distribuindo corridas gratuitas e elevando o nível de consciência dos interessados. São Francisco também é famosa por ter uma frota de táxis bastante insuficiente.
Isso tornava a cidade ideal para o lançamento da Uber na região. Os primeiros usuários estavam fartos de um serviço medíocre e a experiência da empresa caiu na região como uma luva. Quem começava a utilizar o Uber, ia para os blogs e redes sociais para falar bem da experiência, criando uma reputação para a marca.
A experiência foi um sucesso e se tornou um sinônimo de status social, uma vez que agora as pessoas podiam impressionar os amigos chamando um carro preto de alto padrão com o seu celular. Os primeiros passageiros ficavam imediatamente impressionados e se tornavam usuários fieis a partir da primeira corrida.
Dessa forma, a empresa ganhou vários usuários e entusiastas. Isso foi fundamental para o seu sucesso, uma vez que a Uber precisava dos mesmos para vencer as batalhas contra as leis referentes aos táxis nas grandes cidades.
Os primeiros usuários eram pessoas insatisfeitas com os serviços de táxi e transporte público das suas cidades. Eles rapidamente se tornaram defensores da Uber em diferentes frentes nas quais a empresa precisou combater as antigas leis em vigor.
Focando na experiência do usuário e comodidade, a Uber se tornou uma marca disruptiva. Isso se tornou a identidade da empresa, que abraçou batalhas maiores para modificar como certos setores lidavam com os seus clientes.
Apesar de ser para todos, a Uber ainda leva em consideração os fatores locais de cada região. Conforme se expandiu e se segmentou pelos EUA, atendeu as necessidades de cada público de forma precisa baseada nas particularidades de cada região.
Por exemplo, em países como Índia e Tailândia, o consumidor precisa lidar com congestionamentos horríveis e um poder de compra menor do que em outros lugares. Pensando nisso, a Uber oferece serviços de riquixá (aquele veículo de duas rodas puxado por uma pessoa) e moto, sendo mais rápidos e acessíveis para os consumidores dessas regiões.
Como dito anteriormente, a Uber não é uma empresa de transporte. Sendo assim, ela não precisa lidar com diversas questões que uma empresa de táxis precisa, por exemplo.
Sendo “apenas” uma plataforma online que conecta motoristas e passageiros através dos seus celulares, a Uber eliminou a necessidade de ter uma frota enorme em toda nova cidade para a qual se expande.
Esse modelo elimina diversas barreiras para o crescimento da empresa e aumenta muito a possibilidade de escala. Isso também permite que a Uber se aventure em serviços de entrega, como o Uber Eats, sem precisar modificar drasticamente o modelo de operação do negócio.
A grande maioria dos motoristas utiliza o próprio carro, o que elimina a necessidade da Uber de comprar uma frota de carros para entrar em um novo mercado. Isso também elimina os possíveis gastos com consertos ou seguros.
Outra vantagem é que a empresa não precisa contar com um serviço de guincho ou um call center, uma vez que os motoristas resolvem suas questões direto pelo aplicativo. O fato de não precisar lidar com esses custos e a capacidade de ser mais ágil e com um tempo de resposta mais rápido do que o dos concorrentes fez com que a Uber pudesse crescer como nenhuma outra empresa.
Em 10 anos, a companhia já estava nas mais diferentes partes do mundo. Isso é algo que nenhuma empresa de táxi ou transporte convencional poderia fazer.
Você pode achar que o lucro da Uber vem da parcela que a empresa ganha de cada corrida realizada. E você está correto até certo ponto. Mas vai além disso.
A Uber oferece uma plataforma com diversas ofertas de corridas para serem aceitas. Dessa forma, os motoristas podem ganhar dinheiro trabalhando com os próprios carros
Os passageiros pagam pela corrida no app e a empresa pega a sua comissão primeiro, depois passando o resto do valor para os motoristas parceiros. A Uber alega que cobra 25% de todos os motoristas, mas relatos sobre os valores variam.
Apesar disso, a Uber utiliza um serviço de valores dinâmicos, o que é o alicerce de todo o modelo de negócios da empresa. Sendo assim, ela pode tirar vantagem do dinamismo dentro da relação de oferta e demanda e da vontade dos seus passageiros de pagarem.
Ou seja, quando existem mais passageiros pedindo corridas do que motoristas disponíveis numa região, o algoritmo aumenta os valores para equilibrar a disparidade. O primeiro benefício desse modelo é a atração que gera para motoristas buscando ganhar mais dinheiro.
Dessa forma, as áreas de maior demanda estão sempre com uma frota maior de motoristas à disposição. O segundo benefício é o de filtrar os passageiros, baseado em quanto eles valorizam cada corrida. Assim, a Uber pode segmentar a sua base de usuários e satisfazer aqueles que mais precisam e valorizam o serviço.
A Uber também conta com um serviço de aluguel para motoristas que desejam aderir. Eles precisam pagar um depósito inicial pelo carro e os outros pagamentos são debitados automaticamente do valor semanal que os motoristas conseguem.
Existem milhões de pessoas que interagem com carros filiados à Uber todos os dias. Não apenas os passageiros, mas também aqueles que veem os carros no trânsito.
Isso faz com que esses mesmos carros se tornem uma grande chance para que marcas do mundo todo exponham seus logos ou produtos nos carros da empresa. As marcas podem expor seus produtos com telas em cima dos carros, envelopando os veículos ou com adesivos.
Todas essas maneiras são formas bastante tradicionais de propaganda. Dito isso, como a Uber tem um número enorme de motoristas parceiros, o negócio acaba se tornando lucrativo.
Apesar de parecer óbvio, é preciso reforçar que os motoristas precisam aceitar isso em seus carros e ganhar um valor extra caso aceitem. Tudo é feito em parceria com os motoristas.
O plano de expansão inicial da Uber foi um grande exemplo de “pedir desculpas ao invés de pedir permissão”. Como veremos mais adiante, a política da empresa mudou completamente desde então.
Porém, no seu momento inicial, essa mentalidade foi o que transformou a Uber em um fenômeno. Mas, ao mesmo tempo, também trouxe uma série de problemas e polêmicas.
A Uber utilizou uma mentalidade praticamente militar para adentrar em novos mercados. E o foco era apenas um: vencer.
O primeiro exemplo disso foi a expansão em São Francisco. A empresa recebeu uma ordem para recolher os carros, uma vez que não seguia as leis em relação a serviços de táxi.
Como resposta, a companhia ignorou a ordem e ainda soltou um comunicado bastante arrogante em relação ao ocorrido. A Uber contou com o apoio dos seus usuários fiéis e investimentos com parceiros para lutar nessa batalha. E enquanto isso acontecia, a empresa expandiu seus negócios para diferentes partes do mundo.
No começo, a Uber tratava cada cidade como um projeto individual. Eles investigavam o que precisava ser feito em cada caso e isso dava muito trabalho. Porém, havia um mercado para ser monopolizado e eles precisavam fazer isso de forma mais rápida.
Logo, a empresa notou que pensar nas cidades de forma individual era um processo lento. Sendo assim, a Uber montou um processo baseado nos seus aprendizados até então e criou um playbook bastante agressivo para sua expansão. Vamos entender um pouco
melhor sobre ele.
1- Entrar secretamente em cada mercado: recrutar motoristas e passageiros por meio de embaixadores da marca, que recebem uma comissão e créditos na Uber. Oferecer corridas gratuitas e criar uma base forte de clientes.
2- Ignorar as ameaças de processos judiciais: criar o argumento de que os clientes querem que a Uber esteja ali, mesmo que o governo diga o contrário.
3- Ignorar ações do governo: quando o governo ameaça multar motoristas, garantir que a Uber irá cobrir todos os custos.
4- Começar a criar projetos de lei: peça a legalização das operações e crie uma imagem positiva da sua empresa. Associe-se a grupos comunitários locais e outros líderes das comunidades. Envolva os clientes em petições.
5- Monopolizar o mercado: contratar mais motoristas parceiros, colocar mais dinheiro em divulgação e criar grandes campanhas de marketing.
6- Destruir a competição: contrate os motoristas dos concorrentes oferecendo valores mais altos e utilize diferentes táticas para atrapalhar os concorrentes.
Esse era o processo da Uber e é preciso salientar de existirem outros pequenos processos envolvidos em cada um dos 6 passos. Esse playbook foi implementado por um time novo dentro da Uber, sob a supervisão de Kalanick, o CEO da empresa na época.
Apesar de ser um processo extremamente agressivo, isso fez com que o valor de mercado da Uber subisse de $3.7 bilhões de dólares para $41.2 bilhões em apenas 15 meses. O grande mérito do playbook foi que as ações causaram a impressão de que a Uber foi lançada de forma repentina.
Dessa maneira, as autoridades não tiveram tempo para elaborar um plano de resposta e foram pegas de surpresa. O plano parecia perfeito.
Não é uma surpresa que a Uber tenha sido largamente criticada pelas suas práticas agressivas. Dentre as principais acusações estão a falta de segurança para os motoristas e passageiros, o não cumprimento de leis trabalhistas e o desrespeito com as leis locais.
O playbook da Uber fez mais sucesso em países democráticos onde a lei é popular, não civil. Em países como EUA, Canadá e Reino Unido, as leis são mais flexíveis e estão a mercê de interpretação do sistema judicial.
Sendo assim, a Uber teve mais tempo para montar as suas estratégias defensivas e encontrar mais brechas na lei. Nos EUA, a Uber utilizou o entusiasmo dos seus usuários para pressionar os políticos locais para criarem leis que permitissem a operação livre da empresa.
Apesar disso, em países de lei civil, como China, França, Alemanha e boa parte da Europa, a história foi diferente. Isso resultou em diversas multas, banimentos e percas em diversos mercados.
Por exemplo, a Uber foi banida de operar em partes da França, Alemanha, Espanha, Holanda e Bélgica. A empresa foi acusada de ignorar e desrespeitar a lei dos países e por colocar tanto os passageiros quanto os motoristas em perigo.
A Uber também enfrentou problemas em países com leis trabalhistas mais rígidas. Por esses motivos, a empresa foi temporariamente banida na Colômbia e enfrentou problemas parecidos no Chile e Argentina. A sua presença em diversos países gerou problemas enormes, desde protestos e revoltas até enfrentamentos com sindicatos raivosos, principalmente de taxistas.
A Uber também teve problemas no seu lançamento na China e perdeu bilhões de dólares tentando se restabelecer no mercado chinês. Um dos principais motivos para o fracasso inicial da empresa na China foi o fato de não ter previsto a quantidade de mudanças que precisaria fazer para adentrar o mercado.
Além de já ter um competidor estabelecido no país, a Didi, o Google Maps não funciona na China. Sendo assim, a Uber precisou refazer os seus serviços de localização.
Outro problema foi que a Uber utiliza cartões de crédito como principal forma de pagamento. Porém, na China, a maioria dos consumidores faz pagamentos por meio de aplicativos.
O grande problema foi que os principais aplicativos de pagamento do país, WeChat e Alipay, são parceiros da principal concorrente da Uber na China. Ou seja, a empresa americana precisou negociar com seus rivais comerciais para que os consumidores pudessem pagar pelas suas corridas.
As políticas chinesas em relação à concorrência também foram um obstáculo. Ao contrário de outros lugares do mundo, o governo chinês busca promover empresas locais e táticas agressivas de lançamento não são aceitas. Sendo assim, em casos de disputas judiciais, o governo chinês irá sempre ficar ao lado das empresas domésticas.
Apesar dos seus diversos problemas, a Uber conseguiu resultados impressionantes ao redor do mundo. Mas esse sucesso também os transformou em alvos.
Empresas domésticas com bom financiamento começaram a replicar e melhorar os processos da Uber. Isso rapidamente limitou o valor da empresa americana em diversos países e fez com que fossem expulsos de várias regiões pelos seus competidores.
Após contratarem um novo CEO e começar a “limpar a casa” no final de 2017, a Uber caminhou rumo a estratégias menos agressivas para a sua expansão. Em 2018, a empresa decidiu se retirar de alguns mercados ao invés de tentar vencer de qualquer maneira.
Enquanto alguns podem enxergar a retirada como uma derrota, a Uber utilizou a sua entrada meteórica em alguns mercados como uma oportunidade. Ao invés de competir em todas as frentes, a empresa utilizou a sua vantagem como marca estabelecida para comprar ações de empresas domésticas.
Sendo assim, a Uber comprou 15.4% da chinesa Didi, 38% da russa Yandex Taxi e 23.2% da Asia’s Grab, que possui muita força no sudeste asiático. A mudança de estratégia se mostrou muito bem vinda.
Todo esse processo ensinou uma lição valiosa: ser ultra agressivo pode ser uma espada de dois gumes. É fácil afirmar que a expansão agressiva da Uber a transformou na empresa que ela é hoje. Mas os escândalos, erros e polemicas custaram bilhões em perdas dentro de certos mercados.
A Uber precisava de três elementos-chave para prosperar como uma empresa global.
1- Um grupo de gerentes para cada país, responsáveis pelos seus mercados individuais.
2- Um entendimento de como esses mercados se diferenciam;
3- A time unido e exclusivo para criar um comando central;
Sob o comando de Kalanick, a Uber tinha os dois primeiros. Haviam times regionais fortes e uma estrutura de comando não centralizada. Isso permitia que a empresa pudesse utilizar o seu famoso playbook.
Porém, a Uber precisava de um time executivo unido para coordenar as operações globais. Isso incluindo as ações dos times regionais. Além disso, falta de comprometimento, desrespeito e brigas internas eram a regra, não a exceção. E reuniões importantes eram canceladas de última hora com frequência.
Quando olhamos o playbook da Uber, isso não surpreende. A empresa sempre jogou para ganhar e fizeram um ótimo trabalho recrutando um time com a mesma vontade incansável de vencer.
Porém, um dos problemas disso é que a busca cega pela vitória e formas de burlar a lei faz com que fique difícil definir o que é ético ou não. E não apenas fora, mas também dentro da empresa.
Conforme a Uber crescia rapidamente, crescia também a sua cultura tóxica e práticas questionáveis. Isso levou a uma série de constantes e desagradáveis desafios públicos. Na lista, podemos incluir disputas políticas internas, alegações de espionagem corporativa e investigações criminais.
E para acrescentar, ainda havia brigas com reguladores, empresas de táxi e até mesmo motoristas parceiros. A Uber viu a repercussão negativa aparecer em alguns dos seus mercados-chave. O auge foi a campanha #DeleteUber.
O aprendizado tirado disso foi a percepção de que é preciso saber a hora de mudar a cultura da empresa. Enquanto crescia, a Uber nunca havia olhado para dentro, mais especificamente para a sua cultura corporativa.
A empresa não era apenas uma startup, havia se tornado um gigante global e devia ter começado a agir de forma mais responsável muito antes. No final, a companhia foi obrigada a mudar, mas não sem antes causar danos à própria marca.
Quando a Uber decidiu mudar as coisas, duas áreas ganharam maior atenção: a cultura corporativa/valores da empresa e a marca pública. Dara Khosrowshahi, o atual CEO da Uber, disse que os colaboradores foram consultados sobre o que deveria representar a marca daquele momento em diante.
Ouvir, observar e aprender se tornaram o carro chefe da mudança cultural da Uber. Desde a mudança, alguns dos executivos da empresa tem feito um esforço ainda maior.
Muitos participaram da rotina dos motoristas, dirigindo carros para entender o que os motoristas passam diariamente. “Sujar as mãos” se tornou um dos pilares da nova cultura. E os motoristas passaram a se chamar “motoristas parceiros”.
O atual CEO ainda afirmou que alguns executivos podem acabar perdendo focada realidade. E para evitar isso, toda vez que viaja para uma cidade diferente, ele conversa com o máximo de motoristas parceiros que pode para entender como os serviços podem melhorar.
A empresa também mudou como se comunica com os governos e reguladores. Antes, tudo era feito por meio de advogados com um tom arrogante. Agora, a Uber está tentando falar sobre as suas demandas e encontrar um caminho do meio, que sirva tanto os interesses da empresa quanto os dos governos.
Apesar de ainda estar lidando com desafios, a empresa abraçou uma mentalidade mais humanizada. E isso já começou a ter resultados. Mas para que esses resultados sejam maiores, é preciso também mudar a imagem da marca.
A Uber também embarcou em uma campanha de rebranding enorme. A intensão era passar uma imagem mais progressista que iria refletir melhor os princípios da empresa.
A missão do rebrand era clara: fazer os clientes acreditarem que toda a reputação negativa da empresa foi embora com o antigo CEO. Para isso, a empresa decidiu refazer toda a sua identidade visual.
O novo logo da Uber é o alicerce dos esforços. Ele incorpora o senso de mobilidade, acessibilidade e amizade que não era encontrado antes. A companhia tinha o objetivo de criar uma marca capaz de ser reconhecida de maneira instantânea, além de funcionar ao redor do globo e passar a ideia de que é eficiente para executar o que for preciso.
O que começou como “o motorista pessoal de todo mundo” virou “seguir em frente e seguir juntos”. O novo logo foi apoiado por criativos que incluíam pessoas do mundo todo, o que serviu para dois objetivos.
Primeiro, era representar a Uber como uma marca global. E segundo, para adicionar o aspecto humano na marca, transformando a Uber em algo mais empático, com o qual as pessoas podem se identificar.
Um ótimo exemplo recente de uma campanha da Uber foi o #GratefulUK. A campanha agradecia os agentes de saúde pelo seu árduo trabalho durante a pandemia de Covid-19. A empresa ofereceu corridas e refeições grátis durante o período do natal para todos os trabalhadores do sistema de saúde britânico. Eles também encorajaram as pessoas a compartilhar cartas, poemas e desenhos agradecendo os heróicos trabalhadores.
Outro ponto de mudança foi a decisão de 2019, quando a empresa foi a IPO. Dessa forma, a Uber completou o ciclo do rebranding que havia iniciado em 2017 com a saída de Kalanick do cargo de CEO.
Menos de dois anos depois do início do rebrand, a Uber decidiu ir ao IPO. Mas não se engane, isso tudo fez parte da estratégia.
Por quê? As pessoas têm uma tendência a enxergar as empresas com IPO como mais maduras. Isso também gerou um certo senso de responsabilidade porque as empresas que chegam ao IPO precisam responder relatórios com frequência e são obrigadas a passar por processos regulatórios.
Isso tudo abre a empresa para grupos de investidores, o que gera mais transparência. E isso era exatamente o que a Uber precisava depois de todos os escândalos prévios.
Também é preciso dizer que ir ao IPO aumenta a receita de uma empresa. Isso gera mais dinheiro em caixa, o que a Uber necessitava de forma urgente após passar alguns anos perdendo bilhões de dólares. Dito isso, o IPO da Uber não saiu exatamente como o esperado.
As avaliações iniciais colocaram o valor de mercado da Uber em $120 bilhões de dólares. Isso faria da empresa americana a mais valiosa a se tornar pública. Porém, as ações da Uber saíram por $45 dólares e a avaliação da marca ficou em $82.4 bilhões de dólares.
O valor ficou abaixo do que muitos esperavam, porém, ainda assim, se tornou um dos IPO’s mais valiosos da história. Dito isso, as ações da Uber começaram a cair logo de cara, mas não iremos entrar em detalhes sobre isso aqui.
O que realmente importa é que com isso, a empresa agora sofre novas pressões. Os investidores e donos de ações querem resultados trimestrais e evitar perdas. E como veremos adiante, isso não tem acontecido.
Com o passar dos anos, a Uber se tornou muito mais do que apenas um aplicativo que conecta passageiros e motoristas. A sua tecnologia permitiu a criação de novos serviços, o que possibilita que a empresa possa sonhar cada vez mais alto.
Ao introduzir novos serviços que aumentam o valor da marca na visão dos consumidores, a Uber cria novas oportunidades de capturar uma parte ainda maior da carteira dos seus consumidores. Isso tudo enquanto gera diferentes formas de criar mais receita para os motoristas parceiros.
Uber Freight é basicamente o Uber que conhecemos, mas para caminhões. A empresa lançou o seu app de caminhões sob demanda em 2017. A ideia por trás era bastante simples: unir quem precisa de uma transportadora a um caminhoneiro parceiro.
Em agosto de 2018, a Freight se tornou um braço separado. Esse movimento permitiu que a nova frente ganhasse mais notoriedade e pudesse gastar mais dinheiro. Após se separar da Uber, a Freight expandiu.
Em 2020, um grupo de investimento anunciou a intenção de investir $500 milhões de dólares na Uber Freight. Na época do anúncio, a Uber afirmou que manteria grande parte da empresa e que iria utilizar os novos fundos para continuar melhorando a logística da plataforma. Isso ajudaria os caminhoneiros a se comunicarem melhor com as transportadoras.
O serviço de delivery Uber Eats foi lançado em 2016 e foi considerado o próximo passo lógico para a Uber. Ele se relaciona facilmente com o serviço tradicional da empresa e faz uso da larga frota de motoristas parceiros que a empresa já possui.
O Uber Eats foi lançado como um aplicativo separado e ganhou popularidade rapidamente. O novo serviço permitiu que os consumidores utilizassem as plataformas da Uber com uma frequência ainda maior.
Os consumidores que utilizam os dois aplicativos costumam, em média, solicitar 11,5 corridas por mês. Enquanto os que utilizam apenas um dos serviços solicitam em média 4,9 corridas ao mês.
Enquanto os clientes se beneficiaram com a conveniência do novo serviço, os motoristas também foram beneficiados. Com o Uber Eats, eles ganharam uma nova fonte de renda e um maior fluxo de corridas durante o dia. Isso aumentou o número de motoristas parceiros nos aplicativos.
Os motoristas que agora possuem novas fontes de renda, poderiam parar de utilizar os serviços da concorrência. Uma dor da Uber era que os seus motoristas parceiros, por muitas vezes, utilizavam aplicativos concorrentes para aumentar suas receitas. O Lyft é um exemplo desses aplicativos.
O Uber Eats também foi essencial para a empresa durante a pandemia de Covid-19. Enquanto o aplicativo de corridas diminuiu sua receita em 24%, o de delivery cresceu em 200%. O que evitou uma perda muito maior de caixa durante o ano de 2020. E essa perda seria inevitável se a Uber não tivesse diversificado os seus negócios.
Talvez você já tenha ouvido falar no grupo de tecnologias avançadas da Uber, o ATG. Ele foi criado em 2016, com o propósito de desenvolver carros com piloto automático. Ou seja, carros que se dirigem sozinhos. Kalanick, o CEO da época, via esse movimento como fundamental para o futuro da Uber.
Apesar disso, a ATG trouxe grandes custos e problemas na segurança dos testes. Durante o período pandêmico, a Uber fez grandes esforços para conter a perda de dinheiro. Por isso, em 2020, a ATG foi adquirida por uma startup competidora, a Aurora Innovation.
Na verdade, a Uber vendeu a sua parte da ATG para a Aurora e depois investiu $400 milhões de dólares no grupo. Isso deu 26% das ações da empresa para a Uber. E o CEO da empresa de corridas, Dara Khosrowshahi também entrou para o conselho da Aurora.
Apesar da Uber alegar que será lucrativa em breve, muitos mantêm um certo tom de dúvida em relação a isso. A Uber vem perdendo bilhões de dólares nos últimos anos.
Apesar das perdas terem diminuído em 2020 devido ao Uber Eats, a empresa ainda perdeu $6.77 bilhões de dólares. A Uber planejava diminuir as perdas em 2021, mas pela pandemia, precisou gastar centenas de milhões de dólares.
Tudo isso para incentivar seus motoristas a voltarem para as ruas uma vez que a situação melhorou um pouco e as demandas por corridas subiram. Foi um golpe duro para a empresa.
No seu S-1, um documento que toda empresa precisa enviar caso queira ir a IPO, a própria Uber falou sobre a possibilidade de nunca se tornar lucrativa. Mas como uma empresa de tanto sucesso, que é um ímã de investimentos, continua lidando com tantas perdas?
A grande questão é que a Uber não tem uma vantagem sobre seus competidores. Um aplicativo de corridas é algo extremamente fácil de ser replicado, e tem sido, em todas as partes do mundo. E uma vez que tem competidores, a Uber não fornece um serviço muito mais eficiente do que o da concorrência.
Como sempre, tudo depende do corte de custos. A necessidade de motoristas humanos que estão tentando ganhar um salário parece ser o maior problema da Uber. Eles custam muito caro.
Por isso a Uber aposta tanto em um futuro com carros que se dirigem sozinhos. Eles poderiam diminuir em até 80% os custos da empresa. Mas como já vimos, a empresa americana já vendeu a sua frente de tecnologia.
A explicação mais simples para o modelo da Uber é a de que a empresa está focada em crescer e não em lucrar. Investimentos bilionários garantiram que a empresa pudesse continuar crescendo até estar em todos os lugares. E dessa forma, fez com que os consumidores precisassem dos seus serviços.
O problema é que ao contrário de empresas que conseguiram uma espécie de monopólio, como a Amazon, a Uber não fornece um serviço diferenciado. A empresa de corridas americana tem um serviço bastante semelhante ao das suas concorrentes, o que não permite que ela domine o mercado.
A busca por lucro da Uber parece ter sido a razão pela qual em abril de 2021, o custo de uma corrida havia subido em 40%, segundo o New York Times. O aumento parece ter se dado devido à falta de motoristas parceiros na época.
A Uber é famosa por não pagar bem seus motoristas (segundo os próprios motoristas). O problema é que isso só funciona até um grande número deles decidir não trabalhar durante um determinado período.
Para balancear isso, a Uber precisa subir o preço das corridas. Mas dessa forma, acaba arriscando perder a sua força no mercado. Se as suas corridas forem mais caras, os passageiros não têm motivos para não utilizar os serviços de concorrentes.
Então, qual é a solução? Essa resposta é o futuro da Uber. A empresa tem tentado se posicionar como uma indústria de transportes, uma vez que ser um aplicativo de corridas não tem se mostrado ser um modelo sustentável. E isso é um problema enfrentado por todos, não apenas pela Uber.
Uma das soluções encontradas pela Uber para aumentar a sua receita é um serviço anunciado recentemente chamado “Journey Ads“. O objetivo do novo projeto é apresentar publicidade de marcas interessadas durante a corrida dos passageiros.
Segundo a própria Uber, a iniciativa irá exibir propagandas baseadas no destino do passageiro e no seu trajeto. Isso irá criar uma espécie de jornada de compras.
Só o tempo irá dizer se a iniciativa dará resultados, mas a entrada da Uber no mundo do marketing digital é mais um sinal de que nenhuma empresa pode se dar ao luxo de ignorar a presença digital.
E isso serve para as empresas que estão anunciando ou para as que são plataformas de anúncio. Todas precisam estar no digital se buscam crescer.
A história da Uber é a história de uma das empresas de maior sucesso da última década. Um crescimento meteórico e uma posição agressiva levaram a empresa americana ao topo muito rápido. Mas tudo isso veio com um preço bastante alto.
O crescimento da Uber tem se mostrado insustentável em diferentes frentes. E mesmo com todo o sucesso, a Uber continua não sendo um negócio lucrativo. Isso tudo só expõe a necessidade de um crescimento organizado e estratégico.
Para montar essas estratégias, pensadas exclusivamente para a sua empresa e o momento dela, uma assessoria de marketing é fundamental. Dessa forma, a V4 Company, maior assessoria de marketing digital do Brasil, desenvolveu o método V4.
Ele foi feito para empresas que buscam destaque no digital. Mas que não possuem um time especializado em marketing.
O método conta com 4 pilares: tráfego, engajamento, conversão e retenção. Dessa forma é possível metrificar e entender o momento da empresa, além de definir quais as melhores estratégias para o seu negócio.
Quer conhecer mais sobre a V4 Company? Então assista o vídeo abaixo: